Visitas que nos tocam
Agente Comunitária de Saúde: Fui na casa da D. Marcinha hoje, lembra que conversamos sobre a sobrinha dela, Andréia, que está grávida?
Já marcamos a consulta de Pré-Natal 2 (duas) vezes, mas ela não veio… D. Marcinha falou que ela continua usando drogas e só fica deitada no quarto…
Vamos lá.
Inicialmente podemos ter algumas resistências frente à essa proposição:
Fazer o quê? Ela não quer fazer pré-natal… Não temos como obrigar, já marcamos duas vezes…Vamos deixá-la mal acostumada, e ela e todas as mulheres vão querer fazer as consultas de pré-natal em casa, aí não vou dar conta…
Visita Domiciliar não é só para os acamados?
Vamos lá, vamos ouvir e ver o que acontece.
Chegamos em uma casinha, 4 cômodos, até grande para os padrões da comunidade.
Lá reside uma família há muito nossa conhecida, o avô falecido há 3 meses, apresentava depressão grave, a avó com um declínio cognitivo, provável Alzheimer, tio com esquizofrenia paranóide, por vezes recluso ao domicílio e irmã abrindo um quadro de transtorno bipolar, ainda em avaliação.
Num quartinho sem janelas, Andreia estava deitada em um colchão no chão com o filho de 3 anos, sonolenta. Pedimos permissão, e sem julgarmos dissemos: “Se você permitir, vamos te examinar e fazer sua primeira consulta do pré-natal aqui hoje”.
Com um olhar surpreso ela consente e pouco fala durante o atendimento. Perguntamos se quer que marquemos a coleta dos exames em casa ou se ela vai para o Centro de Saúde realizar a coleta, ela afirma “Pode deixar que eu vou!”.
E ela foi. E foi nas outras consultas, algumas vezes atrasada, mas junto com o parceiro. E junto com ele tratou a Sífilis, sem perder nenhuma dose. Sem voltar a usar crack.
Em um dos atendimentos perguntei: “O que mudou daquela primeira visita para agora?”
“Eu estava paralisada, sem saber o que fazer, mudou que senti que tinham pessoas que se preocupavam comigo, então eu também teria que me preocupar comigo e com o meu bebê”.
Foto lendária: Foto do nosso professor Luis Guilherme tirada pelo nosso outro professor Rodolfo Corrêa, quando o primeira era preceptor do segundo, durante uma visita domiciliar. Repare no posicionamento corporal adotado para, de modo especular, demonstrar respeito pela pessoa visitada
Muitas vezes não sabemos quais os pequenos gatilhos que desencadeiam uma mudança importante, cabe-nos apenas estar presente, escutar e oferecer o que é possível. Contudo, em uma comunidade de Alta vulnerabilidade como eleger os que merecem mais cuidados? Como exercer o princípio da Equidade?
Nesse caso, a Escala de Coelho Savassi nos ajudou a selecionar a prioridade da visita! Você conhece esse e outros instrumentos que podem auxiliá-lo no cuidado domiciliar?
Nós da Dexpertio queremos estar juntos nesses momentos, pois acreditamos que mesmo pequenas atitudes podem tornar-se muito significativas quando fundamentadas no conhecimento!
Você e sua Equipe já tiveram casos semelhantes? Que ação foi tomada que você julgou mais importante nesse processo?
Bibliografia
Aplicação de Escala de Risco Familiar como instrumento de prioriza~ao das Visitas Domiciliares. COELHO, Fhivio Lucio G; SAVASSI, Leonardo CM, Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, 2004.